Domicílio Judicial Eletrônico e racionalização das comunicações processuais
Obrigação de cadastramento nos serviços eletrônicos de citação. É preciso estar atento.
A informatização dos processos judiciais remonta à Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. Dentre as disposições da lei, previu-se que todas as citações no processo eletrônico passariam a ser feitas por meio eletrônico, o que vem se concretizando à medida em que os sistemas desenvolvidos pelos órgãos do Poder Judiciário se aperfeiçoam.
Em agosto de 2021, entrou em vigor a Lei nº 14.195/2021, chamada de “Lei do Ambiente de Negócios” – por ter introduzido dispositivos na legislação brasileira com o objetivo de desburocratizar e incentivar atividades empresariais.
O Capítulo X da Lei nº 14.195/2021, intitulado “Da Racionalização Processual”, promoveu alterações nos artigos 238, 246 e 247 do Código de Processo Civil, tendo como ponto de partida da pretendida racionalização das citações a criação de um banco de dados do Poder Judiciário, a ser regulamentado pelo Conselho Nacional de Justiça.
Nesse contexto, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução nº 455 de 27/04/2022, instituindo o Portal de Serviços do Poder Judiciário, bem como regulamentando o Diário da Justiça Nacional e o Domicílio Judicial Eletrônico – originalmente criado pela Resolução nº 234/2016.
Dispôs o artigo 16 da Resolução nº 455/2022 que o cadastro no Domicílio Judicial Eletrônico será obrigatório para a União, para os Estados, para o Distrito Federal, para os Municípios, para as entidades da administração indireta e para as empresas públicas e privadas, para efeitos de recebimento de citações e intimações, conforme disposto no art. 246, caput e § 1º, do CPC/2015, com a alteração realizada pela Lei nº 14.195/2021.
Para desenvolver, implementar e disponibilizar o Domicílio Judicial Eletrônico, o Conselho Nacional de Justiça firmou parceria com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e estabeleceu que, num primeiro momento, apenas estariam obrigadas a se cadastrar as instituições financeiras vinculadas à Febraban.
Nos termos da Portaria nº 29/2023 do CNJ, a obrigatoriedade de cadastro para as demais pessoas referidas no artigo 16 da Resolução nº 455/2022 ainda será definida por Ato da Presidência do Conselho Nacional de Justiça, tendo em vista que a liberação de acesso ao Domicílio Judicial Eletrônico está ocorrendo de modo faseado, com um cronograma específico de acordo com o público-alvo. O cronograma está disponível no portal eletrônico do Conselho Nacional de Justiça (https://www.cnj.jus.br/tecnologia-da-informacao-e-comunicacao/justica-4-0/domicilio-judicial-eletronico/).
De acordo com o cronograma do CNJ, o prazo das instituições financeiras para cadastramento no sistema teve início em 16/02/2023 e término em 15/08/2023. Ainda não foi publicado o Ato da Presidência informando a data de início para as demais instituições privadas, mas é possível que isso se dê ao longo de 2024.
Considerando as disposições do art. 44 da Lei 14.195/2021, da Resolução CNJ nº 455/2022 e da Portaria nº 29/2023 do CNJ, é possível sintetizar as regras que deverão ser observadas pelas empresas para o recebimento das citações eletrônicas da seguinte maneira:
(1) A citação será feita “preferencialmente” por meio eletrônico, em até 2 dias úteis, contados da decisão que a determinar (art. 246, CPC);
(2) O mandado será enviado por meio eletrônico ao e-mail cadastrado pela empresa no sistema do Tribunal vinculado ao Domicílio Judicial Eletrônico (art. 77, inciso VII, CPC);
(3) A empresa deverá confirmar que foi citada em até 3 (três) dias úteis, contados do recebimento da citação eletrônica (art. 246, §1º-A, CPC);
(4) No quinto dia útil seguinte à confirmação do recebimento da citação eletrônica o prazo para responder/contestar terá início (art. 231, inciso IX, CPC);
(5) Se a empresa não confirmar o recebimento nos 3 (três) dias úteis indicados em “(3)”, a citação será novamente realizada, agora por algum dos métodos “antigos”, como a citação por carta ou por oficial de justiça (art. 246, §1º-A, incisos, CPC);
(6) Uma vez citada pelos métodos antigos, a empresa deverá, na primeira oportunidade, apresentar um justo motivo para não ter confirmado o recebimento da citação (item “3”) (art. 246, §1-B, CPC);
(7) Se a empresa deixar de confirmar o recebimento eletrônico da citação sem justa causa, poderá ser multada em até 5% do valor da causa por ato atentatório à dignidade da justiça (Art. 246, §1º-C, CPC);
(8) Para o funcionamento ocorrer como visto nos itens “(1)” a “(7)”, o CNJ instituiu o Portal de Serviços do Poder Judiciário e o Domicílio Judicial Eletrônico. O primeiro é uma plataforma que permitirá a efetivação de citações, intimações e comunicações processuais em todos os sistemas de tramitação processual eletrônica (cada tribunal tem o seu) conectados à PDPJ-Br (Plataforma Digital do Poder Judiciário). O segundo será o ambiente digital para a comunicação processual entre o Judiciário e os destinatários (partes ou não). Por ele que as citações eletrônicas ocorrerão;
(9) O cadastro no Domicílio Judicial Eletrônico será obrigatório para empresas privadas, dentre outros (art. 16); e
(10) A Resolução atribui ao usuário do Domicílio Judicial Eletrônico a responsabilidade pelo (a) acesso ao seu provedor de internet e (b) pelo acompanhamento do regular recebimento das petições e documentos transmitidos eletronicamente.
O CNJ elaborou um Manual do Usuário do sistema para auxiliar as empresas e pessoas físicas no primeiro acesso. O acesso deverá ser feito por certificado digital. Para isso, será preciso instalar o software PJE Office.
Por ora, continua valendo o que vem sendo praticado pelos Tribunais.
No Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por exemplo, as empresas foram obrigadas, em 2020, a vincular um e-mail ao SISTCADPJ (Sistema de Cadastro de Pessoas Jurídicas Públicas ou Privadas) e acompanhar o recebimento das citações eletrônicas. Ao recebê-las, devem se manifestar dentro do prazo próprio ao procedimento, que será contado do dia útil seguinte à data indicada no sistema como do recebimento da citação eletrônica. Sem multa, sem confirmação, sem justa causa, só o ônus de acompanhar, se manifestar e ser revel, se for o caso.
Por isso é que boa parte das empresas, ou as mais estruturadas, mantém atualizado o cadastro no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, destacando uma ou mais pessoas para monitorar o recebimento de citações e intimações no endereço eletrônico cadastrado no Sistema.
Ainda que as empresas possam já estar organizadas para esse acompanhamento, o Domicílio Judicial Eletrônico será diferente (vide regras da Lei 14.195/2021) e operado em âmbito nacional (num banco de dados desenvolvido pelo CNJ). Assim, os departamentos jurídicos devem se certificar de promover o cadastramento quando determinado pelo CNJ. Bem como reforçar (i) os controles internos para gestão do recebimento das comunicações, definindo responsáveis, rotinas de verificação, práticas de encaminhamento de citações e demais comunicações, regras de compliance etc.; e (ii) o alinhamento de rotinas de trabalho e condutas com escritórios contábeis e jurídicos, para assegurar melhor controle e acompanhamento.
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